Produtividade na indústria brasileira
Fatores externos e internos prejudicam produtividade da indústria brasileira em geral, mas primeiro passo está em fazer o dever de casa
Publicado em 29 de abril de 2025 | 08:00 |Por: Thiago Rodrigo

Reportagem originalmente publicada na Móbile Fornecedores 279 em 2017
Pessoas e cargos desta matéria consideram os profissionais da época da publicação
A produtividade física do trabalho na indústria de transformação teve queda de 1,8% entre 2010 e 2015, segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Quanto aos setores, no acumulado do último ano, cinco tiveram queda e móveis (-8,4%) foi um dos principais destaques negativos. A Utilização da Capacidade Instalada dessazonalizada (também com dados da CNI) teve em 2016 o menor valor da série histórica iniciada em 2003, fechando o ano com 76%.
Fator tão importante para a competitividade, a produtividade da indústria brasileira tem deixado a desejar nos últimos anos. Com isso, continua a apresentar desempenho negativo no mercado mundial. De acordo com a CNI, em dez anos, quatro dos cinco indicadores de competitividade registraram perda: a produtividade do trabalho efetiva teve queda de 17% entre 2005 e 2015.
Já a produtividade do trabalhador da indústria brasileira – medida como o produto dividido pelas horas trabalhadas – vem crescendo em ritmo moderado. Em 2015, registrou crescimento de 0,4%. Isso fez com que o acumulado dos últimos 10 anos (2005 a 2015) ficasse em 6,2%. A publicação Indicadores de Competitividade da Indústria, da CNI, aponta que nos anos recentes, o ritmo de aumento da produtividade do trabalho diminuiu, refletindo os efeitos da recessão da atividade econômica. No quinquênio 2005/2010, a taxa de crescimento acumulada da produtividade foi de 4,8%. Essa taxa se reduziu para 1,3% entre 2010 e 2015.
O aumento da produtividade é um dos principais desafios da indústria brasileira. Para a diretora de desenvolvimento tecnológico da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Maria Luisa Campos Machado Leal, além da perda do dinamismo econômico advindo das crises estruturais da economia, a produtividade na indústria apresenta uma tendência de queda em comparação com os países avançados, provocada por fatores internos e externos ao chão de fábrica.
Em sua visão, a situação econômica internacional e a crise econômica provocaram uma desvalorização da moeda nacional, proporcionando um equilíbrio dos custos e uma maior competitividade internacional da indústria brasileira, o que gerou um superávit da balança comercial mais recentemente. “Internamente, o cenário econômico negativo provocou uma diminuição dos investimentos e da demanda por produtos industrializados, causando uma queda de produtividade da indústria”, avalia Maria Luisa.
Causas para baixa produtividade na indústria moveleira
Desafios históricos têm impedido um crescimento sustentável da economia e da indústria brasileira e são velhos conhecidos. Segundo o livro Produtividade no Brasil, organizado por Fernanda De Negri e Luiz Ricardo Cavalvante, a baixa infraestrutura é uma delas e não atende satisfatoriamente as próprias potencialidades da produção brasileira, com rodovias sucateadas, ferrovias em desuso e portos com variados problemas, aumentando os custos internos de produção.
Além disso, o sistema tributário complexo, com um ambiente de negócios desfavorável ao empreendedorismo diminui o crescimento da produtividade no país. Outros fatores, segundo o livro, são a questão do câmbio, a competição interna de produtos importados e a inserção internacional do país no comércio exterior.
“No Brasil, todos esses fatores são ruins, ou seja, nós temos uma infraestrutura deficiente, transporte caro, burocracia elevada, alta carga tributária e sistema tributário complicado. Há uma dificuldade de licenciamento ambiental, dificuldade para abrir empresa, dificuldades para contratar e demitir trabalhadores. Tem uma legislação trabalhista que desestimula que o trabalhador seja produtivo”, pontua o gerente-executivo de pesquisa e competitividade da CNI, Renato da Fonseca.
– Leia mais sobre produtividade no setor moveleiro
Para Maria Luisa, “a complexidade do sistema tributário brasileiro, aliada à alta carga tributária, também penaliza a produção, a geração de empregos e competitividade da indústria brasileira. Adicionalmente, estão baixas taxas de inovação, baixa taxa de qualificação dos trabalhadores, infraestrutura, práticas de gestão interna e baixo grau de investimentos em novos maquinários e equipamentos industriais”, enxerga a diretora da ABDI.
Outro ponto de atenção apontado é a gestão interna das indústrias. “[Elas] precisam ter melhores práticas gerenciais, layout de chão de fábrica e ferramentas, novas formas organizacionais, além do aperfeiçoamento dos processos produtivos internos das empresas, principalmente por meio da inovação e gestão”, assinala Maria Luisa – veja mais sobre esses assuntos nas próximas páginas.
Inovação e tecnologia
Investimentos em gestão, inovação e tecnologia e mão de obra são fatores primordiais para alavancar a produtividade das indústrias, apontam os especialistas. A ABDI acredita que a inovação e a tecnologia são fatores preponderantes para o aumento real da produtividade, seja em escala nacional, regional ou global, com modificações em processos (que aumentam a produção física a partir dos mesmos fatores) e em tecnologias para novos produtos.
Fonseca, da CNI, acrescenta que a empresa precisa estar inovando. “Ela pode inovar tanto comprando máquinas novas como desenvolvendo o mesmo produto com materiais diferentes. Então você passa a vender um móvel que retarda chama, por exemplo, ou um móvel impermeável, ou seja, se deve inovar com maquinário, com o tipo de material que você usa e pode inovar também na gestão”, considera.
Aperfeiçoamento da gestão
As indústrias precisam ter melhores práticas gerenciais, ferramentas eficientes que eliminem desperdícios de todos os tipos e novas formas organizacionais de produção. “Muito pode ser feito para aperfeiçoar os processos produtivos internos das empresas, principalmente por meio da inovação e da gestão, repensar o produto, as tecnologias utilizadas na produção e embarcadas no produto para aumentar a capacidade produtiva e buscar novos mercados internacionais”, pontua Maria Luisa, da ABDI.
Essa obtenção de ganho na produtividade ocorre com foco na redução de desperdícios e melhorias dos processos de trabalho (veja mais na reportagem manufatura enxuta nas páginas seguintes). “Vários são os ganhos de produtividade que podem reduzir desperdícios e melhorar os processos produtivos. Dessa forma, para detectar problemas, como excesso de estoque, deslocamento desnecessário de funcionários e aplicar soluções, com base na metodologia de manufatura enxuta, a ABDI criou, juntamente com outros parceiros, o programa Brasil Mais Produtivo”, diz Maria Luisa.
Fonseca cita como exemplo a fabricante de móveis e estofados de Bento Gonçalves (RS), MO Design, que participou do projeto. A indústria elevou a produção de 12 para 16 sofás em um dia, um ganho de 33%. “Esse exemplo dessa fábrica mostra exatamente isso e o que foi feito foi organizar o processo, com menos desperdício, aumentando a produtividade e apenas mudando a gestão, sem gastar um tostão”, conta o gerente da CNI.
Mas é claro, segundo ele, que também se precisa fazer um investimento inicial para aumentar a produtividade. “Porém, quando isso é feito, acaba-se tendo custos menores. Ou é desenvolvido um produto com qualidade superior. No fundo, investir em inovação, na capacitação do trabalhador, fazer a gestão, é um custo que se paga”, destaca.
Educação da mão de obra
Outro fator de longo prazo, crucial para o aumento da produtividade brasileira, é a questão da qualificação e da capacitação da mão de obra. “O Brasil avançou muito nos últimos vinte anos em relação à escolaridade média de sua população, mas grandes investimentos em educação são necessários, principalmente aqueles relacionados com as áreas produtivas, como ciência, tecnologia, engenharia, matemática etc., além do fortalecimento da integração entre a universidade e a indústria”, pontua a diretora da ABDI.
A questão da mão de obra é outro fator que dificulta o ganho da produtividade e na visão de Fonseca é um problema do País. “O aprendizado é essencial para as empresas ganharem produtividade. E aí se tem dificuldade, tanto em conseguir um trabalhador qualificado quanto em qualificar para trabalhar. Isso porque, às vezes, o trabalhador não tem interesse em ser qualificado ou a empresa acha que ele não ficará muito tempo nela e não quer gastar recursos”, analisa. Dessa forma, ele pontua que as indústrias contam com pessoas que não conseguem desempenhar o máximo que poderia e também não são criativas para dar novas ideias e melhorar os processos.
Apesar da estagnação da produtividade, a ABDI defende que a retomada do crescimento econômico, dos investimentos produtivos e da demanda das famílias poderá devolver ao país uma tendência de melhora da produtividade, trazendo novas oportunidades para superar velhos entraves. “A indústria brasileira precisa se reinventar. Para isso, são indispensáveis investimentos em ciência, tecnologia e inovação, por meio de políticas públicas e da força da iniciativa privada. Somente assim, o Brasil poderá retornar ao eixo de um desenvolvimento sustentado”, observa Maria Luisa.