Consumidor mostra otimismo cauteloso
Indicadores de setembro apontam melhora nas expectativas do consumidor, apesar de limitações como juros altos e endividamento das famílias
Publicado em 20 de outubro de 2025 | 12:40 |Por: Julia Magalhães

Setembro trouxe um alívio pontual para a confiança do consumidor e do comércio, mas o cenário ainda exige cautela. Com a inflação mostrando sinais de aceleração nas principais capitais e o crédito continuando restrito, o varejo de móveis segue enfrentando desafios para transformar expectativas em vendas.
A análise dos principais indicadores de mercado do mês ajuda a compor o retrato atual do setor.
Melhora nas expectativas, mas com base frágil
O Índice de Confiança do Consumidor (ICC), medido pela FGV IBRE, subiu 1,3 ponto em setembro, atingindo 87,5 pontos – o maior nível desde dezembro do ano passado. A alta foi puxada exclusivamente pela recuperação nas expectativas para os próximos meses.
O Índice de Expectativas (IE) avançou 3,7 pontos, alcançando 91,8, enquanto o Índice de Situação Atual (ISA) caiu 2,5 pontos, para 82,0, interrompendo duas altas seguidas.
“Após oscilar dentro de uma estreita faixa nos últimos três meses, a alta da confiança do consumidor, de setembro, leva o indicador para o maior nível desde dezembro do ano passado e volta a delinear uma lenta recuperação das perdas incorridas no fim de 2024”, pontua a economista do FGV IBRE, Anna Carolina Gouveia.
Segundo ela, o avanço reflete uma percepção mais otimista em relação à economia futura em todas as faixas de renda, impulsionada pelo mercado de trabalho ainda aquecido e pela recente trégua inflacionária. “No entanto, os altos níveis de endividamento e inadimplência das famílias seguem como um limitador da melhora mais robusta da confiança”, alerta.
Entre os quesitos que compõem o ISA, o indicador de situação econômica local atual recua 0,8 ponto, para 93,2 pontos, e o indicador de situação financeira atual da família cai em 4,3 pontos, para 71,1 pontos.
Em contrapartida, entre os quesitos do IE, o indicador de situação econômica local futura avança 6,9 pontos, para 104,6 pontos, recuperando mais do que as perdas incorridas nos três meses anteriores. A situação financeira futura da família também avança, subindo 4,1 pontos, para 83,9, revertendo parte da queda intensa dos últimos dois meses.
Para o varejo de móveis, o dado mais relevante talvez seja a estabilidade do indicador de compras previstas de bens duráveis, que ficou em 88,2 pontos – o maior desde dezembro de 2024. Isso indica disposição moderada para compras, mas ainda sem um impulso significativo.
Varejo encontra respiro pontual
O Índice de Confiança do Comércio (ICOM) também apresentou leve avanço, subindo 1,6 ponto em setembro, para 84,7 pontos, após duas quedas consecutivas. Segundo o FGV IBRE, esse resultado ainda não representa reversão de tendência, mas uma estabilização em patamar baixo.
A alta foi percebida em cinco dos seis principais segmentos do comércio e veio tanto das avaliações sobre o momento atual quanto das perspectivas futuras. O Índice de Situação Atual (ISA-COM) subiu 1,7 ponto, para 88,2 pontos, com destaque para a melhora na percepção da demanda atual.
Já o Índice de Expectativas (IE-COM) também avançou 1,7 ponto, para 82,0, com elevação tímida nas previsões de vendas e uma recuperação mais expressiva nas expectativas sobre os próximos seis meses.
Apesar dos sinais positivos, a economista Geórgia Veloso, também da FGV IBRE, observa que o cenário de juros elevados e endividamento das famílias ainda limita a conversão de expectativa em consumo efetivo. “O momento favorável, de baixo desemprego e renda familiar em alta, não se traduz em otimismo porque os juros altos e o endividamento elevado freiam o consumo”, destaca.
“Após dois meses de queda, a confiança do comércio subiu em setembro. No entanto, a alta não representou uma reversão do pessimismo, mas sim uma estabilização em patamar baixo”, afirma Geórgia.
No mercado moveleiro, isso se reflete em um comportamento de compra mais cauteloso, onde o consumidor analisa mais antes de renovar ambientes ou investir em peças maiores, como estofados e dormitórios. No entanto, outubro marca o início do último trimestre do ano, tradicionalmente conhecido como o “trimestre de ouro” do varejo, impulsionado por datas como a Black Friday e o Natal.
Mesmo em um cenário de cautela, muitos consumidores costumam reservar esses períodos para realizar compras de maior valor agregado, o que pode favorecer a retomada gradual das vendas no setor.
De fato, os dados do Índice Cielo do Varejo Ampliado (ICVA) de agosto – último levantamento disponível – indicam uma retração real de 2,6% nas vendas do varejo na comparação com o mesmo período de 2024, já descontada a inflação.
Apesar disso, o acumulado do ano registra crescimento real de 1,7%, o que demonstra um ritmo moderado, mas positivo, com oscilações ao longo dos meses.
No recorte setorial, os segmentos mais dependentes de crédito, como móveis e eletrodomésticos, seguem entre os mais afetados, o que reforça o ambiente de cautela para o setor.
Inflação pressiona orçamento doméstico
Outro fator que pode afetar diretamente o varejo é a inflação. O IPC-S da terceira quadrissemana de setembro subiu 0,33%, acumulando alta de 3,44% em 12 meses. A aceleração foi registrada em todas as sete capitais pesquisadas pela FGV.
Recife liderou o aumento, com variação de 0,60%, impulsionada por itens como passagem aérea (18,03%). Já Brasília registrou a menor variação (0,17%), beneficiada pela redução no subitem tarifa de eletricidade residencial. Em São Paulo, a principal praça do varejo brasileiro, a alta foi de 0,31%, revertendo quedas anteriores.
O aumento generalizado do IPC-S impõe pressão ao orçamento doméstico, o que tende a despriorizar compras de maior valor agregado, como móveis, especialmente em períodos sem estímulos promocionais ou datas comemorativas.
Ambiente empresarial dá sinal de estabilidade
Por outro lado, o Índice de Confiança Empresarial (ICE) avançou 0,5 ponto, para 89,9 pontos em setembro. Após três meses de queda, o avanço é visto como um sinal positivo, embora insuficiente para reverter a tendência de desaceleração iniciada em junho.
O Índice da Situação Atual Empresarial (ISA-E) subiu 1,1 ponto, recuperando parte das perdas anteriores, mas as expectativas seguem em trajetória de queda.
O Índice de Expectativas Empresariais (IE-E) recuou 0,3 ponto, para 85,9 – o menor patamar desde a pandemia em 2020. A queda está relacionada ao enfraquecimento da demanda prevista para os três meses seguintes, apesar de uma leve melhora na perspectiva de negócios no médio prazo.
No comércio de móveis, isso reforça um cenário de contenção de investimentos em expansão ou novos pontos de venda. A maior parte das estratégias segue voltada para adequação de mix, reforço no digital e foco em ticket médio.
Incerteza recua e sinaliza ambiente menos volátil
O Indicador de Incerteza da Economia (IIE-Br) recuou 4,2 pontos em setembro, para 106,5, voltando a um patamar considerado confortável. Esse movimento foi puxado pela queda do componente de Mídia, que mede o volume de notícias com conteúdo incerto, e também pela redução da dispersão das previsões de especialistas em relação a variáveis macroeconômicas.
“A segunda queda consecutiva do Indicador de Incerteza sugere uma atenuação das pressões externas, com os agentes econômicos já assimilando os efeitos das tarifas norte-americanas, inclusive em alguns dos setores mais expostos. No cenário interno, a perda de fôlego da inflação e a desaceleração da economia alinham-se às previsões dos especialistas, sem gerar ruídos adicionais pelo lado da atividade econômica”, analisa Anna Carolina.
De acordo com a economista do FGV, com o resultado, o IIE-Br retorna a um patamar considerado confortável de incerteza. “A sua manutenção dependerá, no front externo, da redução das tensões geopolíticas e, no âmbito doméstico, do ritmo da atividade econômica e do encaminhamento das questões fiscais”, afirma.
O dado traz um alívio temporário e reforça a importância da estabilidade como fator decisivo para estimular o consumo e dar fôlego ao setor varejista.
Perspectivas entre confiança e contenção
Embora os indicadores de setembro sinalizem certa recuperação na confiança e leve redução da incerteza, o varejo moveleiro ainda encontra obstáculos no caminho. A alta dos juros, o endividamento das famílias e a inflação pontual em itens essenciais são fatores que continuam impactando o poder de compra.
Para os próximos meses, a expectativa é de um aquecimento moderado com a chegada das campanhas promocionais e datas como a Black Friday. Ainda assim, o desempenho do setor dependerá da conversão efetiva da melhora nas expectativas em decisões de compra, algo que exige não só confiança, mas renda disponível e condições facilitadas de pagamento.
Neste cenário, ganham ainda mais relevância as estratégias que combinam condições facilitadas de pagamento, foco em móveis de reposição e uma comunicação clara sobre os diferenciais de cada produto no ponto de venda.
Estratégias para aproveitar o estímulo de fim de ano
- Antecipar campanhas promocionais, aproveitando o movimento do “Black November”, que dilui as ofertas ao longo do mês, em vez de concentrar apenas na sexta-feira da Black Friday;
- Apostar em condições diferenciadas de pagamento, como Pix parcelado ou financiamento próprio, para driblar os juros altos e atrair consumidores que buscam flexibilidade;
- Investir na integração entre canais on-line e físico, garantindo uma experiência de compra fluida entre a pesquisa digital e a aquisição na loja;
- Trabalhar com dados e personalização, oferecendo ofertas mais aderentes aos perfis dos clientes para aumentar a taxa de conversão.
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