Impactos do tarifaço são sentidos no mercado moveleiro

Abimóvel apresenta linha do tempo que retrata a evolução do cenário e medidas adotadas até o momento e detalhes do plano de contingência do governo

Publicado em 15 de agosto de 2025 | 15:30 |Por: Thiago Rodrigo

As exportações brasileiras de móveis e colchões prontos encerraram o primeiro semestre de 2025 com crescimento de 6,8% frente a igual período do ano passado, totalizando US$ 374,2 milhões embarcados entre janeiro e junho. O avanço reflete um trabalho constante de fortalecimento da presença internacional do mobiliário brasileiro, com ganhos de competitividade apoiados em design, gestão da sustentabilidade, diferenciais técnicos dos produtos brasileiros e visibilidade global.

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O chamado “tarifaço” dos Estados Unidos, contudo, vem provocando reações diversas ao longo da cadeia desde seu anúncio em abril. Em maio, as exportações cresceram 12,3%, com US$ 70,3 milhões embarcados – número que expressa, em especial, o envio antecipado de produtos relativos a contratos firmados com os EUA, frente à imposição da nova tarifa, que à época já havia sido elevada para 10%. Em junho, porém, diante da confirmação da medida e de novas especulações tarifárias, houve uma retração imediata de 3%, com US$ 68,1 milhões exportados.

Abimóvel

Móveis brasileiros para os EUA

Principal mercado importador do mobiliário brasileiro, os Estados Unidos responderam por 28% das exportações de móveis e colchões prontos no semestre. A participação do país norte-americano saltou para 38,4% ao se considerar também os componentes, máquinas e demais suprimentos para a fabricação de móveis.

Por falar na indústria fornecedora, apesar do bom desempenho no segmento de móveis e colchões prontos, o resultado agregado das exportações da cadeia de componentes, tintas, vernizes, máquinas, equipamentos e demais insumos para a fabricação de móveis apresentou queda de 2,5% no primeiro semestre de 2025. O valor total exportado passou de US$ 1,758 bilhão no mesmo período de 2024 para US$ 1,715 bilhão este ano. Resultado também decorrente das Ordens Executivas dos EUA que impactaram componentes, fornecedores e máquinas.Abimóvel

Perspectivas para o mercado moveleiro

Agora, com a entrada em vigor da tarifa de 50% sobre diversos produtos brasileiros, incluindo móveis de madeira – responsável por 80% da pauta exportadora de produtos acabados no setor –, dá-se início uma nova fase para a indústria nacional, marcada pela necessidade de diálogo, inteligência setorial, reposicionamento comercial, readequação produtiva e reavaliação de mercados prioritários.

Os impactos são especialmente significativos nos principais polos exportadores do país, como Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, que juntos exportam quase 99% dos móveis brasileiros. Estados como Bahia, Pernambuco, Paraíba e Pará, que vêm ampliando sua inserção internacional, também deverão ser afetados em suas estratégias de consolidação.

“A parceria da indústria brasileira de móveis com o mercado americano é estratégica, uma relação construída ao longo de mais de 20 anos, com produtos de alto valor agregado, especialmente quando falamos das madeiras nacionais,. O impacto de uma tarifa unilateral como essa é extremamente preocupante para o segmento, podendo resultar na perda de 9 a 10 mil postos de trabalho e do fechamento de parques fabris”, esclarece Cândida Cervieri, diretora-executiva da Abimóvel.Abimóvel

Abimóvel discute impactos com governo

Diante do novo cenário, a Abimóvel participou, no início da semana passada (04 de agosto), de mais uma reunião interministerial convocada pelo Governo Federal, sob a liderança do vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin. O encontro contou com a presença de representantes do Palácio do Planalto, da Casa Civil, dos ministérios da Fazenda, da Agricultura e Pecuária, do Desenvolvimento Agrário, da Pesca e Aquicultura, da Companhia Nacional de Abastecimento, da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, além de lideranças do agronegócio e de setores produtivos da indústria de transformação.

Representando a cadeia moveleira nacional, a Abimóvel esteve presente por meio de sua diretora-executiva: “Nossa principal reivindicação foi de manter o diálogo aberto com o governo americano, buscando a exclusão dos móveis de madeira desse pacote de medidas tarifárias, a exemplo do que foi feito com outros itens da pauta. Claro, apresentamos também ao governo brasileiro sugestões emergenciais como linhas de financiamento aos exportadores por meio do BNDES e do fundo garantidor, o retorno do Reintegra, medidas trabalhistas semelhantes às adotadas durante a pandemia, além de regimes especiais de drawback”, explicou Cândida Cervieri.

A diretora também compartilhou de uma análise técnica sobre o impacto da medida no setor: “A ‘supertaxação’ americana sobre os móveis de madeira e outros itens da pauta exportadora moveleira aprofunda um cenário de vulnerabilidade para centenas de empresas que investiram em adaptação técnica e comercial ao mercado dos Estados Unidos, e que têm nas exportações uma de suas principais atividades. Já observamos reflexos imediatos como cancelamentos de contratos, suspensão de embarques, paralisação produtiva com férias coletivas e acúmulo de estoques”.Abimóvel

Esforços diplomáticos e plano de contingência

Durante a reunião, o vice-presidente Geraldo Alckmin reafirmou a posição do Governo Federal em favor da reversão da tarifa. “Não há qualquer justificativa técnica ou comercial para essa tarifa. Oito dos dez principais produtos que os Estados Unidos exportam para o Brasil entram com tarifa zero. A taxa média de importação brasileira é de apenas 2,7%. Defendemos o livre comércio e o multilateralismo, com base no respeito mútuo e na previsibilidade”, discursou.

Alckmin informou que, desde março, o Brasil está em tratativas com o governo dos EUA e que já obteve êxito na exclusão de aproximadamente 65% das exportações brasileiras da nova tarifação, o que representa cerca de US$ 26 bilhões em produtos isentos. Reforçou, ainda, que o setor moveleiro e os demais presentes na reunião seguiam como prioridades nas negociações em curso e anunciou o lançamento de um plano de contingência para os próximos dias (agora publicado).

A reunião também destacou a importância de diversificar mercados e consolidar a presença brasileira em destinos alternativos. A ApexBrasil, parceira da Abimóvel no Projeto Brazilian Furniture, é uma das frente que atua na abertura de novas parcerias comerciais, com foco em países de diversas regiões, como da União Europeia, Reino Unido, Singapura e integrantes do bloco EFTA (Associação Europeia de Livre Comércio). A Abimóvel reforçou, no entanto, que a produção voltada ao mercado norte-americano é, na grande maioria dos casos, altamente customizada, o que limita o redirecionamento para outros destinos ou para o mercado interno.

Plano Brasil Soberano

Nesta quarta-feira (14), o Governo Federal apresentou, então, o plano de contingência para amparar empresas afetadas pela sobretaxa americana. Batizado de “Plano Brasil Soberano”, o pacote inclui uma linha de crédito de até R$ 30 bilhões para ajudar as companhias que foram prejudicadas pelo tarifaço, além do adiamento de impostos federais, maior ressarcimento de créditos tributários e uma reformulação nas garantias à exportação para facilitar a busca de novos mercados. As ações paliativas estão em uma MP (medida provisória), com vigência imediata e que precisará ser apreciada pelo Congresso em até 120 dias.

O plano é dividido em três eixos: fortalecimento do setor produtivo; proteção de trabalhadores brasileiros; e diplomacia comercial e multilateralismo. “A Abimóvel acompanha com atenção o plano anunciado pelo governo. No setor moveleiro, reiteramos que nossa prioridade seja a exclusão dos móveis de madeira e demais itens da pauta exportadora da medida americana”, diz Cândida, que prossegue:

“Ainda assim, diante da urgência e da gravidade do cenário, é essencial que ações factíveis sejam colocadas em prática para reduzir impactos imediatos e evitar perdas permanentes de mercado, priorizando-se instrumentos fundamentais para manter a atividade econômica e proteger empregos. Se implementadas de forma rápida e coordenada, essas medidas podem garantir certo fôlego às empresas no curto prazo em um momento de retração e incerteza. Toda iniciativa articulada com a indústria nacional é bem-vinda, desde que o apoio chegue efetivamente às empresas mais vulneráveis da cadeia produtiva”.

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