A influência dos comportamentos de consumo na marcenaria
Comportamentos de consumo na marcenaria: o que os consumidores querem de acordo com os espaços onde vivem e os estilos de vida que escolhem
Publicado em 25 de janeiro de 2025 | 08:00 |Por: Thiago Rodrigo
Reportagem originalmente publicada na Móbile Sob Medida 107 em 2017
Pessoas e cargos desta matéria consideram os profissionais da época da publicação
Conhecer os diferentes comportamentos de consumo é mais do que saber como o consumidor de móveis se comporta. Entender as transformações do mundo e das pessoas é importante para poder, acima de tudo, desenvolver melhorias no produto de acordo com o que o cliente realmente precisa.
O mercado de móveis sob medida, assim como a indústria moveleira, recebe grandes impactos que fazem repensar o mobiliário por conta dessa metamorfose. Atualmente, antes de tomar uma decisão de compra, os consumidores pesquisam, buscam informações e pedem opinião para poder conhecer melhor as marcas e tomar uma decisão com segurança.
O avanço da tecnologia é um dos fatores que mais impactaram o comportamento do consumidor nos últimos anos. Com Netflix e Spotify, um rack ou home theather não precisa ter espaços para DVDs ou aparelhos de som, pois tudo pode ser acessado em uma Smart TV localizada no painel de um apartamento de 30 m². O WhatsApp, lançado em 2009, com o avanço das redes móveis possibilitou o contato instantâneo entre as pessoas, alterando a forma como nos comunicamos, sendo também utilizado pelas marcenarias para o contato com o cliente.
Há dez, quinze anos, essas e outras coisas eram muito diferentes e isso modificou a forma como as pessoas tratam o espaço em que vivem. O novo morar é uma realidade cada vez mais presente na sociedade atual no qual a personalidade e a identidade dos indivíduos são importantes aspectos que influenciam os desejos de consumo e a relação das pessoas com os ambientes da casa, gerando novos estilos de vidas.
Para a designer e arquiteta do escritório Katalin Stammer Arquitetura e Design, Katalin Stammer, a personalização e a customização dos ambientes de acordo são palavras-chave desse novo contexto. “O cliente quer sentir que ele realmente tem uma necessidade específica e essa necessidade pode ser atendida de uma forma muito personalizada”, diz Katalin.
Atualmente, as pessoas tem diferentes estilos de vida e dinâmicas de rotina pessoal. Assim, a designer pontua que os marceneiros podem tentar tirar proveito disso por meio de um serviço diferenciado. “Entender mais o que o cliente está pedindo, ouvir mais esse cliente e se utilizar das vantagens do mercado sob medida, como ferragens diferenciadas, para oferecer uma solução mais completa”, assinala. Isso deve ser feito pelo marceneiro também de forma que seja enaltecido o valor agregado oferecido pela marcenaria.
Mudanças do comportamento de consumo
De acordo com a gerente de marketing da Eucatex, Andrea Krause, há duas questões que influenciaram o consumo no Brasil. A primeira é a internet e o consequente acesso à informação, como “os youtubers e influenciadores que hoje têm acesso direto ao público que, por sua vez, escolhe aquilo que ele entende como sendo tendência”, explica. E outra é a mudança muito forte nas gerações mais jovens na comparação com as gerações mais antigas.
“Precisamos olhar esse movimento e entender um pouco melhor essa mudança no comportamento até como forma de reconhecer como fazer a proposta de projeto, porque as mudanças que influenciam o morar brasileiro têm a ver não somente com a questão da internet, mas também com os novos arranjos familiares e, principalmente, com gostos e preferências”, pontua.
Segundo a gerente da Eucatex, os profissionais marceneiros devem estar muito atentos a essas mudanças. “Não podemos mais projetar para clientes de dez anos atrás. O cliente de hoje tem outras expectativas, outras formas de enxergar o ambiente da casa e o próprio jeito de morar”, diz. Andrea também acrescenta ser preciso acompanhar essas transformações e ser extremamente criativo.
Katalin pontua que o marceneiro deve abrir a cabeça para essas modificações do mercado de forma que valorize a própria profissão do marceneiro. Um exemplo é a onda do Do it Yourself (faça você mesmo) em que, com o acesso a internet, como citado acima, as pessoas as pessoas podem elas mesmas montar o móvel, criar seu projeto e fazer na revenda os processos de corte, colagem e furação. Diante disso, o marceneiro deve ser muito mais do que a pessoa que faz o móvel.
“O que o marceneiro deve oferecer, na verdade, é uma gestão do serviço, muito mais completa e com otimização de tempo. Tem que saber realmente se posicionar no mercado e mostrar a diferença de um cliente que vai direto à revenda do que o que quer o produto dele, muito mais especializado e com conhecimento de causa. Então, chega a hora de posicionar as vantagens de ter um profissional habilitado e instruído a fazer isso”, declara a designer.
Gerações de consumo
Além de dessas perspectivas de transformação do consumidor, há também as gerações de consumo, ou seja, grupos de pessoas que, com distintos contextos históricos, sociais, culturais e tecnológicos, apresentam similares características de consumo – são as chamadas gerações X, Y e Z, além dos Baby Boomers.
Conforme pontua o designer Marcos Bastista, do Studio Marcos Bastista, as gerações mais velhas tem certa consciência, mas ainda tem o DNA de modelos antigos de consumo, como realizar compras por status e para ter coisas. “O ter coisas da geração velha é o patrimônio. O patrimônio das gerações mais novas é a experiência e o acesso”, assinala.
Nesse rol de gerações mais novas se enquadram as gerações Y e Z. A primeira também é chamada de “milennials”, por ter nascida desde a década de 1980 até a virada do ano, é a primeira geração que cresceu junto à internet, priorizando a experiência e o bom relacionamento. Enquanto a geração Z são os futuros consumidores, nascidos a partir de 1995 ou 2000, que priorizam o imediatismo e a rapidez, tendo nascido com o smartphone em casa.
Batista enxerga que essas gerações mais novas vão ditar as regras do mercado. “As compras dessas pessoas são baseadas por sustentabilidade e experiência, do que propriamente por uma marca que tinha certo nome no mercado ou por preço. Então, as pessoas com consciência de consumo compram por uma causa. No passado a gente comprava por preço, hoje a gente compra por valor”, pontua.
Novo morar
O tamanho dos apartamentos nos grandes centros urbanos vem diminuindo. Um exemplo é que o número de apartamentos vendidos em São Paulo com um único dormitório cresceu mais que 400% entre 2004 e 2013, segundo o Secovi-SP. Esse fato provoca transformações na mentalidade das pessoas que passam a prezar por praticidade e pelo consumo consciente.
Também prezam para a localização da moradia ser próxima ao trabalho, compartilham mais os espaços como serviços de condomínio, e geram transformações relevantes para diversos como imobiliária, mobiliária, entre outros.
Segundo Katalin, essa nova forma de morar, em princípio, começa como um movimento de pessoas que estão tentando simplificar a vida de alguma forma e viver melhor. Nesse caso, mais especificamente as Tiny Houses, dão essa flexibilidade.
“Elas dão uma possibilidade de vida mais leve em relação às rotinas, principalmente. Então, ela chama um público que culturalmente tem um conhecimento e um nível de estresse que acaba pedindo isso. Tem a ver com um movimento minimalista de querer esvaziar a mente, a rotina, o todo”, explica.
– Tendências de consumo para 2025
O novo morar ocorre da metamorfose das pessoas que passam a repensar os valores social, econômico, político, familiar e religioso. “A sociedade está mudando seu comportamento e sua forma de encarar a vida e isso reflete diretamente no consumo de produtos, na rotina, o que gostamos de fazer e na forma que formatamos uma família. Então, todos os pilares sociais nós mudamos e isso reflete em uma mudança de espaço”, assinala Katalin.
Nesse novo morar há uma quebra de paradigmas no qual tecnologia, sustentabilidade, coletividade e identidade, são algumas das palavras-chave que são observadas como mais impactantes nos modos de vidas das pessoas. Mas há várias outros conceitos e tendências que se enquadram dentro dessa nova realidade das casas como posse descartável, no qual as pessoas não querem mais se imobilizar porque não querem ficar fixas; relação com o entorno, cujo qual o senso coletivo e o de compartilhar são cada vez maiores, junto à sustentabilidade; e espaços customizados, desejo das pessoas que mostram a personalidade ou o seu jeito de viver delas, estampados nos ambientes.
Katalin aponta que essa expressão da personalidade está dentro do eixo comportamental “personal life”. Outros dois termos são o “organic life”, que ressalta o verde e o natural aos ambientes. No “dynamic life”, o dinamismo está ligado ao movimento da multifuncionalidade e de transformações do móvel e/ou ambiente.
Comportamento de consumo na marcenaria
Entre outras diversas tendências e palavras-chave do novo morar das pessoas que, fique bem claro, envolvem o mobiliário, está micro casas, que remete aos apartamentos cada vez menores; casas inteligentes, com a tecnologia facilitando o cotidiano das pessoas; zonas comunitárias, que mostram os novos formatos de famílias que vai muito além do tradicional pai, mãe e dois filhos; não conforme, no qual as coisas não precisam ser perfeitas; o aconchegante da tendência “hygge”; a reconexão com a natureza; o resgate com o passado e com o feito a mão, que apresenta peças com história; a casa como terapia, sendo um espaço para ser mais do que apenas morar.
Todas são tendências do morar que os marceneiros devem estar atento a esses comportamentos do consumidor para oferecer as melhores soluções aos seus clientes.
Para Andrea, da Eucatex, muitas vezes há algumas variáveis que influenciam fortemente a realidade do dia a dia das pessoas como a mudança de trabalho, por exemplo, que as levam a realizar atividades de trabalho em casa e, então, o ambiente para receber se torna também ambiente de trabalho.
“A redução no tamanho dos apartamentos gera a necessidade do mobiliário híbrido e multifuncional. Novos arranjos familiares em função dos novos formatos de família. Tudo isso representa também um impacto na forma de projetar”, pontua e acrescenta: “Então, temos muitas influências no comportamento de consumo que impactam diretamente no mobiliário. Muitas vezes a padronagem, a cor, a escolha do material tem a ver com essa identidade, com o momento que a pessoa está vivenciando”.
E antes de adquirir um produto, o consumidor está mais informado, tirando todas as dúvidas no celular e buscando maior conhecimento. Por isso, o marceneiro deve ter consciência que as necessidades não são mais comuns como haviam conhecido em um primeiro momento.
“Muitas vezes o cliente pede coisas novas, ainda mais customizadas e bem fora do padrão. Exemplo é o cabideiro, que pode vir só na parte debaixo, depende do foco e uso do cliente. Ou seja, alturas diferentes para certas coisas serem funcionais para o cliente final”, exemplifica Katalin.
Assim, é importante estar atento a essa quebra de paradigma que as pessoas tem feito sozinhas. “Então, o marceneiro tem que estar atento a essa conversa para não inibir o consumidor que está trazendo esse novo conceito de morar porque ele ainda precisa da orientação do fornecedor (no caso, o marceneiro), mas sem tantos pré-conceitos”, assinala.
Era da experiência
Antes se tinha a era da necessidade para foco na produção, depois veio a era do desejo para foco no produto, mas agora é a era da experiência com foco no usuário. Para a marcenaria entender e trabalhar isso em seus serviços, Katalin indica que o profissional deve entregar uma solução, não apenas o móvel. Como já falado anteriormente, as pessoas não querem se sentir imóveis, mas o problema da marcenaria sob medida, segundo a designer, é que ela é tão engessada para um ambiente, rígida para uma situação específica.
“Com as mudanças sociais enormes que temos passado no formato de família, as coisas estão acontecendo muito rápido. Então, oferecer uma solução para o cliente que faça o móvel planejado, mas que de repente uma lateral do móvel soltar um roupeiro, coisas que deem um pouco mais de flexibilidade, mostram ao cliente que o investimento que vai ter com a marcenaria é pautado no conhecimento dela. É diferente de comprar só um mobiliário para guardar”, explica Katalin.
Assim, além do mobiliário, foi feito essa gestão de conteúdo para a venda. “A marcenaria tem de tomar consciência da importância dele na cadeia e em como são formadores de opinião, porque um cliente que é leigo no assunto está aberto ao que vem do profissional, por mais que ele pesquise. Então, todo esse mercado, esse novo consumidor, está focado na troca de experiências e ideias. Essa flexibilidade é um ponto chave da mudança de comportamento”, destaca a designer.
Também nessa era da experiência, não há mais a pesquisa por meio do sexo ou idade, mas sim de gostos e preferências. Com um mix de estilos variados, a personalização já é uma realidade em vários mercados. “Dessa forma, muitas vezes se consegue entregar mais valor agregado e fazer com que o cliente pague até mais por uma experiência diferenciada que recebe. Então, a questão de entender qual é o gosto e a preferência do consumidor brasileiro tem muito a ver com entender a nossa realidade social e econômica”, enxerga Andrea, da Eucatex.
Comportamentos de consumo
Para os marceneiros entenderem os comportamentos durante a elaboração do projeto sob medida, Katalin enxerga que tem de ser observado que o consumidor tem outra reação à compra e venda. “Ele está mais atrás de um parceiro a curto, médio, longo prazo do que uma pessoa que venda uma vez só para ele. Assim, tem que estar atento a esse perfil [de consumidor] que conversa, leva as ideias em outro formato e ele tem as próprias formas de pensar”, ressalta Katalin. Por isso, as mudanças de comportamento das pessoas requerem uma atualização no relacionamento profissional e cliente final.
Dentro disso, Andrea ressalta que é importante que o marceneiro faça as perguntas certas para o cliente e também procure observar e entender um pouco do que esse cliente valoriza dentro do ambiente da decoração. Assim, o marceneiro pode fazer o papel de sugerir, indicar ou valorizar um ou outro item de produto ou materiais dentro de um catálogo. Pensando nisso e para facilitar esse trabalho para a marcenaria, a Eucatex realizou um estudo que analisou os perfis dos consumidores. Assim, criou coleções de padrões de acordo com os grupos de consumo que se caracterizam por gostos e preferências afins.
No estudo realizado pela Eucatex, chegou-se a quatro grupos – veja quais no box. “Quando olhamos para um público mais jovem, que se encaixa num perfil de consumo mais urbano e que no nosso catálogo é o Grafite Game, a gente vê muito as madeiras e as composições ali usadas como orientadas para uma especificação que agrade esse perfil de público. Portanto, o catálogo se torna uma ferramenta. E se vê que para cada grupo de consumo há uma valorização dos gostos, preferências e das combinações na decoração. Dessa forma, ajudamos o profissional a criar mais discurso e alinhar melhor as especificações junto aos clientes”, declara Andrea.