Gatilhos mentais: técnica aumenta as vendas recorrendo ao “cérebro primitivo”
Técnica pode, sim, aumentar os resultados do varejo, mas é preciso tomar cuidado para não incorrer em propaganda enganosa
Publicado em 23 de agosto de 2019 | 16:41 |Por: Everton Lima
A imagem da família reunida tomando café da manhã já virou sinônimo para “comercial de margarina”. Algumas pessoas podem criticar esse apelo sentimental na hora de vender um alimento, e de acordo com as estratégias de marketing, ele está correto. Trata-se de um exemplo de “gatilhos mentais”.
O professor universitário, especialista em Marketing e Comunicação, Sérgio Czajkowski explica que, apesar dos consumidores se informarem sobre uma compra, o fator emocional sempre influenciará na hora de levar o produto para a casa. “Muito embora nós acreditemos que compramos algo devido a uma decisão racional, o que de fato vai definir o momento da compra são determinadas estruturas mais primitivas do cérebro”, explica.
Essas estruturas fazem parte do “cérebro reptiliano”. O cérebro reptiliano é mais imediatista. Isso faz sentido, pois quando se observa o comportamento de um animal, verifica-se que suas atitudes são impulsivas. Na natureza, os seres não têm muito tempo para racionalizar sobre as suas decisões. Sobreviver a um predador, por exemplo, é a melhor escolha possível.
Contudo, os cientistas estão, há algum tempo, analisando como essa estrutura primitiva da mente funciona. Um desses campos de estudo é o Neuromarketing. Ele aplica as descobertas dos neurocientistas ao marketing. Desse modo, os profissionais dessa área estão desenvolvendo novas soluções para conseguir vender os seus produtos e serviços.
Gatilhos mentais: entendendo o cérebro reptiliano
Se você digitar “gatilhos mentais” em sites de pesquisa, perceberá que muitos deles prometem um aumento de vendas extraordinário, como se fosse possível manipular a mente do consumidor. Todavia, Czajkowski explica que esse tema é bem mais complexo.
“O homem tem essa questão desse cérebro reptiliano, mas, aliado a isso existe uma peculiaridade. Nós somos dotados de uma capacidade de análise simbólica. Quando você recebe um ‘bom dia’, você não encara aquilo como um simples cumprimento, mas como uma demonstração de afeto”, esclarece.
É na soma dessa capacidade de interpretar símbolos com o cérebro reptiliano que os gatilhos mentais podem ser aplicados às vendas. “Quando você cria uma peça publicitária informando ao cliente que determinado produto está acabando, você gera nele uma sensação de escassez. É uma ideia de que ou ele age naquele momento ou ele vai perder uma oportunidade”, exemplifica.
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Essa sensação de escassez, de acordo com o professor, é percebida pelo cérebro reptiliano e não pelas partes mais desenvolvidas, capazes de avaliar mais fatores. “Quando você trabalha a noção de escassez você ativa o cérebro primitivo. Quando os ancestrais do homem moderno viviam nas árvores, por exemplo, a noção de escassez era muito importante para a sobrevivência”, conta.
Nesse caso, a mensagem de escassez precisa ser adaptada, ganhando simbolismo. “Você constrói uma peça publicitária que gera no indivíduo, muitas vezes de forma sutil, a ideia de ele precisa fazer aquilo imediatamente. Isso é um exemplo de gatilho mental, de acordo com Czajkowski.
Exemplos de gatilhos mentais
Pesquisas relacionadas ao consumo mostram que esses conceitos são citados pelo cliente, de forma espontânea, ainda que ele não os conheça. Um estudo publicado pelo Sistema de Proteção ao Crédito (SPC,2017) mostra isso.
Os pesquisadores tentaram entender o que motivou os consumidores a comprarem por impulso. 56% deles afirmaram que fizeram as compras para aproveitarem as promoções anunciadas pelos lojistas. “Você vê um monte de gente comprando um produto, então também compra — ainda que não precise”, explica o especialista.
Os limites para o uso dos gatilhos mentais
O especialista esclarece que “o lucro precisa ser consequência e não objetivo”. Além disso, existem órgãos, como o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) e Procon, que podem acatar denúncias contra empresas que estejam realizando um trabalho abusivo.
É possível ilustrar isso com o recente caso da Empiricus, empresa que oferece treinamentos para investidores financeiros. Há alguns meses, a marca lançou uma campanha agressiva, usando gatilhos mentais, como o da escassez. Para o Procon do estado de São Paulo, tratou-se de propaganda enganosa. O órgão decidiu multar a empresa.
“Um erro que as empresas cometem é que, na ânsia de obter lucro a curto prazo, você rompe com a relação de confiança. Isso é um tiro no pé”, conclui o professor.
Ademais, antes de recorrer aos gatilhos mentais indiscriminadamente, o lojista deve se recordar que a propaganda enganosa é crime, como determina o artigo 66 da Lei 8.078/90.