Os 4S do novo consumidor
Decisão de compra do consumidor é cada vez mais não-linear, guiada por quatro comportamentos-chave. Adaptar estratégias pode gerar mais influência e conversões no PDV
Publicado em 2 de setembro de 2025 | 10:48 |Por: Julia Magalhães

O funil de marketing tradicional, que por décadas guiou ações de comunicação e vendas, já não traduz a complexidade atual da jornada do consumidor. Estamos diante de um momento de virada: a digitalização acelerada transformou esse percurso em um emaranhado de caminhos, repleto de variações e difícil de prever.
Nesse contexto, a inteligência artificial (IA) deixa de ser apenas um fator de disrupção para se tornar também uma ferramenta estratégica capaz de ampliar as possibilidades de compreender e influenciar decisões de compra.
Para acompanhar esse novo cenário, as marcas precisam criar conexões por meio de um conjunto cada vez mais diversificado de canais – de plataformas de streaming e experiências de compra on-line a recursos de inteligência artificial generativa e redes sociais. Essa variedade de interações constrói trajetórias únicas, tornando inviável impor um roteiro padrão para todos os consumidores.
Um estudo da Boston Consulting Group (BCG) defende a troca do funil linear por “mapas de influência”, representações mais realistas de como cada interação impacta diferentes etapas da decisão.
Uma compra de móvel, por exemplo, pode começar com um vídeo visto no celular, ser reforçada por um comentário em rede social, evoluir para uma busca aprofundada e se concretizar em uma transação on-line – tudo em poucas horas. Esse movimento é impulsionado pelos “4S”: streaming (assistir), scrolling (navegar), search (buscar) e shopping (comprar).
Entenda os 4S do novo consumidor
Ao contrário da abordagem rígida e sequencial do funil, em que cada um desses comportamentos se limita a etapas específicas, o mapa de influência reconhece que eles ocorrem ao longo de toda a jornada, muitas vezes se sobrepondo e influenciando várias etapas simultaneamente.
No streaming, o consumidor consome conteúdos que vão muito além do entretenimento: são tours virtuais, séries de decoração, demonstrações de montagem. O scrolling funciona como uma vitrine infinita, onde um post patrocinado ou o conteúdo de um influenciador pode plantar a semente do desejo. O search, cada vez mais multimodal e impulsionado por IA, é o momento de explorar opções, comparar preços, ver avaliações e até usar imagens para encontrar o produto exato. Já o shopping é a conversão em si, que hoje pode ocorrer em qualquer ponto de contato – de um link no Instagram a um QR Code na vitrine.
Para entender esse novo cenário, o BCG propõe substituir o funil linear por mapas de influência: representações mais precisas de como cada ponto de contato impacta diferentes fases da decisão de compra.
Isso revela, por exemplo, que um tour 3D em alta qualidade pode ser mais determinante para fechar uma venda do que um anúncio amplamente exibido, mas pouco relevante. No varejo moveleiro, onde a compra é planejada e envolve alto valor, essa precisão na leitura do que realmente influencia é estratégica.
Identificar e priorizar os canais de maior impacto permite alinhar estratégias, mensagens e recursos às necessidades específicas de cada cliente, aumentando a precisão e a eficácia das ações.
Mais que alcance: influência real
A pesquisa também desafia a ideia de que ampla exposição e capacidade de influência caminham necessariamente juntas. Um anúncio com milhões de impressões não garante conversão se não despertar atenção, transmitir confiança e dialogar com necessidades reais.
Mais do que simples visibilidade, o poder de influenciar depende de três fatores principais: o nível de atenção dedicado pelo consumidor naquele momento; a pertinência da mensagem em relação às suas necessidades; e o grau de credibilidade transmitido pelo canal ou plataforma. Esses elementos, aliados ao alcance, devem orientar as decisões sobre quais interações priorizar.
Embora a visibilidade ainda seja relevante, é importante reconhecer que diferentes formas de exposição não têm o mesmo peso em termos de influência. Certos canais com grande cobertura oferecem ampla notoriedade às marcas, mas nem sempre geram impacto real sobre as decisões de compra. Ampliar a visibilidade com influência exige compreender não apenas onde encontrar os consumidores, mas também como atendê-los de forma eficaz.
No varejo de móveis, recursos como demonstrações ao vivo de produtos, uso de simuladores virtuais para visualização em ambiente e conteúdos assinados por especialistas têm se mostrado altamente eficazes para gerar engajamento e estimular a intenção de compra.
O papel da IA
A pesquisa também evidencia o papel central da inteligência artificial, especialmente da IA generativa (GenAI), como catalisadora dessa transformação. Mais do que uma tendência tecnológica, a IA se torna uma das chaves para transformar conhecimento em ação. Com ela, é possível acompanhar e interpretar dados de comportamento em tempo real, prever tendências de forma individualizada e entregar mensagens e ofertas no momento mais propício. No varejo moveleiro, por exemplo, já é viável detectar que um cliente pesquisou conteúdos sobre cozinhas moduladas e oferecer uma promoção personalizada antes que ele busque alternativas em concorrentes. De acordo com o BCG, empresas que integram a IA de forma consistente alcançam crescimento de receita até 60% maior.
Nos próximos anos, o êxito das estratégias de marketing dependerá diretamente da aplicação da IA para desenvolver abordagens personalizadas conforme cada jornada de compra. Isso significa abandonar estruturas ultrapassadas, como o funil linear, e adotar um planejamento orientado à influência real sobre o consumidor.
Para isso, será indispensável compreender a fundo como cada ponto de contato (conquistados, próprios e desenvolvidos em parceria) interfere na decisão, analisando-os de forma integrada:
- Conquistados: quando terceiros falam sobre a marca espontaneamente, como matérias jornalísticas ou recomendações de influenciadores sem patrocínio.
- Próprios: canais controlados pela própria empresa, como site, redes sociais oficiais, blog e aplicativos.
- Desenvolvidos em parceria: iniciativas feitas em conjunto com outras empresas, plataformas ou criadores de conteúdo, como campanhas co-branded ou eventos colaborativos.

Os 4S compreendem: streaming (assistir), scrolling (navegar), search (buscar) e shopping (comprar) | Crédito: OpenAI
Por onde começar
O estudo ressalta que, para atingir excelência no uso da inteligência artificial, as empresas precisam promover uma verdadeira mudança de mentalidade. Isso envolve repensar estruturas de planejamento, investir em novos modelos de gestão de talentos e incentivar uma colaboração estreita entre equipes humanas e sistemas inteligentes. Trata-se de uma transformação cultural e operacional que se sustenta em dois eixos centrais:
- Plano para influência: conduzir pesquisas aprofundadas para mapear os “caminhos de influência” mais significativos da categoria; elaborar mapas detalhados que indiquem o papel de cada ponto de contato (do streaming ao shopping) nas decisões de compra; e reestruturar os planos de marketing para ampliar a influência exercida nesses canais, explorando todo o potencial de formatos e mensagens personalizadas.
- Execução com IA: mensurar o grau de maturidade da adoção de IA na organização em comparação com parâmetros de mercado; identificar, em cada etapa do fluxo de trabalho, onde a IA pode gerar maior valor – seja na análise preditiva de dados, na segmentação avançada de mídia ou na produção e adaptação de conteúdo; e priorizar os caminhos de influência mais estratégicos para iniciar projetos-piloto com potencial de escalar resultados.
Com essa abordagem abrangente e integrada, torna-se possível desenhar estratégias sob medida para cada perfil de consumidor. Quando bem conduzidas, essas ações aumentam a eficácia das campanhas, fortalecem o vínculo com o cliente e elevam as chances de conversão.
Num cenário em que a atenção do consumidor é volátil e a concorrência intensa, entender a nova lógica da jornada de compra é um diferencial competitivo. No varejo de móveis, estar presente nos momentos e canais certos – e de forma relevante – é o que converte interesse em decisão.
Adotar os 4S nesse setor não significa apenas ampliar a presença em múltiplos canais, mas integrá-los de forma inteligente e contínua. É construir pontes sólidas entre físico e digital, ajustar a comunicação ao comportamento real de cada cliente e avaliar não apenas o alcance, mas o impacto efetivo de cada ação.
Afinal, a jornada que leva à compra de um sofá, de uma estante ou de uma cama pode começar em um clique casual, mas só se concretizará se, em cada etapa, o lojista estiver pronto para oferecer relevância e influência.
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Checklist para aplicar o mapa de influência no varejo de móveis
- Mapeie a jornada do seu cliente: entenda quais canais ele usa para descobrir, avaliar e comprar móveis.
- Identifique pontos de contato de alto impacto: avalie não só o alcance, mas a influência real de cada canal.
- Integre os 4S: planeje ações que combinem streaming, scrolling, search e shopping em diferentes momentos.
- Personalize mensagens e ofertas: ajuste comunicação e promoções ao perfil e estágio de cada cliente.
- Use dados e IA para otimizar: monitore comportamento em tempo real e refine campanhas de forma contínua.
- Ofereça experiências fluidas: permita que o cliente transite sem barreiras entre online e offline.
- Revise e ajuste: reavalie pontos de contato e resultados periodicamente para manter relevância e eficácia.
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