Relacionamento que vende

Alta nas vendas, baixa na fidelização: o trimestre de ouro do varejo exige mais do que promoções para gerar resultados sustentáveis

Publicado em 28 de outubro de 2025 | 08:29 |Por: Julia Magalhães

No varejo moveleiro, o último trimestre do ano é mais do que um período de alta nas vendas: é um teste de maturidade comercial. Outubro, novembro e dezembro, tradicionalmente chamados de trimestre de ouro, concentram o maior volume de negócios do setor, mas também colocam à prova a capacidade das lojas de ir além da venda pontual e realmente fidelizar.

Segundo dados da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), a previsão para a Black Friday de 2025 é de movimentar R$ 13,34 bilhões – um salto expressivo em relação aos R$ 9,38 bilhões registrados em 2024, ano em que o evento teve seu maior faturamento desde 2020, somando varejo físico e on-line.

O crescimento se deve à maior adesão dos consumidores (44% em 2024 contra 29% em 2023), ao pagamento do décimo terceiro salário e ao aumento da confiança nas compras digitais.

Embora ainda não haja projeções nacionais consolidadas para o Natal de 2025, os números do ano anterior oferecem um indicativo do potencial do período. Segundo a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) – maior centro comercial do Brasil – o varejo paulista fechou dezembro de 2024 com crescimento de 7,3% em relação ao mesmo mês do ano anterior, registrando faturamento recorde de R$ 138,6 bilhões.

Vendas no setor de móveis

O setor de móveis e decoração, especificamente, acumulou alta de 10,5% em 2024 no comparativo com 2023, o que reforça a importância estratégica das ações de fim de ano para esse nicho.

A combinação de oportunidades comerciais e maior intenção de compra transforma o trimestre em uma vitrine estratégica para o lojista. Mas o sucesso vai muito além das promoções.

“No varejo de móveis, dificilmente é a promoção que garante o resultado. O que faz diferença é a preparação da equipe de vendas, o alinhamento do pós-venda e a organização dos estoques”, afirma a especialista em vendas e fidelização de clientes, Flavia Mardegan.

Segundo ela, muitos consumidores aproveitam o período para investir em mobiliário com a intenção de ter a casa pronta no Natal, e uma loja mal preparada pode não dar conta da demanda nem entregar a experiência que o cliente espera.

O que isso significa na prática? A experiência de compra precisa ser tratada como um projeto completo – e não como uma operação de caixa. “O que transforma uma venda pontual em relacionamento duradouro é a qualidade da experiência proporcionada ao cliente”, explica Flavia.

“Isso passa pelo acolhimento, pela clareza nas informações sobre prazos e condições e, principalmente, pelo acompanhamento no pós-venda.”

Ela observa que muitos vendedores encerram sua atuação após a assinatura do pedido, mas é justamente no pós-venda que a fidelização acontece. “O cliente lembra da pessoa que esteve disponível para resolver eventuais problemas e que demonstrou comprometimento além da compra”, complementa. “Em resumo: o que garante relacionamento é o pós-venda, não apenas a venda.”

A construção de vínculo começa no atendimento. E esse é um ponto especialmente sensível para o setor moveleiro, onde a compra envolve alto valor, expectativa e emoção. “Frequentemente, trata-se de um dos maiores investimentos da vida do consumidor depois da casa própria. O vendedor precisa respeitar esse significado, traduzindo os sonhos do cliente em projeto e, depois, em entrega de qualidade. Tratar cada cliente como único é o que gera confiança e diferencia a loja.”

Flavia resume em uma expressão: “atendimento memorável”. Para isso, ela salienta que é fundamental investir em treinamento, garantindo que a equipe seja empática, preparada e consciente do valor que esse mobiliário representa para o cliente.

Força do relacionamento

Outra dica da especialista é aproveitar o aquecimento das vendas de fim de ano para iniciar um ciclo contínuo de relacionamento – mesmo em um segmento onde a recompra é espaçada. Janeiro, por exemplo, tende a ser um mês mais fraco em vendas. Por isso, manter uma comunicação ativa e cuidadosa com quem já comprou pode ser a chave para estimular novas oportunidades logo no início do ano.

“Manter a comunicação aberta e cuidadosa é essencial. Além disso, o lojista pode ampliar sua rede de relacionamento por meio de parcerias com arquitetos e designers, criando uma carteira diversificada de captação”, orienta. “Isso garante recorrência não necessariamente do mesmo cliente, mas de indicações profissionais qualificadas.”

Segundo ela, em um segmento de ciclo mais longo, a estratégia precisa ir além da transação: “é construir uma jornada do cliente sólida, que gere lembrança positiva e referências”.

Para Flavia, o lojista que trabalha com jornada, e não apenas com metas mensais, entra em 2026 com muito mais previsibilidade e autoridade. E isso vale também para o uso dos recursos oferecidos pela indústria. “O apoio dos fabricantes é importante, mas na maioria das vezes os treinamentos oferecidos ainda são muito focados em produto e pouco atualizados em vendas. O consumidor atual não responde mais a técnicas ultrapassadas de persuasão.”

Ela ressalta que “o que o lojista precisa é investir em capacitação de qualidade, com consultores que entendam não só de vendas, mas do segmento moveleiro”. Além disso, diz, “é essencial estruturar uma jornada clara do cliente dentro da empresa, com processos bem definidos e múltiplas fontes de captação”. Assim, conclui, “campanhas e materiais de fabricantes deixam de ser ações isoladas e passam a integrar uma estratégia consistente, que já projeta 2026 com base em encantamento e fidelização”.

“O ponto central é oferecer um atendimento memorável e um pós-venda consistente”, diz a especialista em vendas e fidelização de clientes, Flavia Mardegan | Crédito: Divulgação

Atendimento supera preço

A busca pelo menor preço já não é mais o principal fator de decisão para os consumidores. De acordo com o relatório CX Trends 2025, desenvolvido pela Octadesk em parceria com a Opinion Box, 78% dos brasileiros afirmam estar dispostos a pagar mais quando recebem um atendimento de qualidade.

O estudo, que ouviu mais de duas mil pessoas, aponta que o relacionamento com o cliente se consolidou como diferencial competitivo – ficando acima de critérios como custo e prazo de entrega.

Além disso, a pesquisa indica que 54% dos consumidores tendem a voltar a comprar de uma marca quando o atendimento é ágil e eficiente, enquanto 41% já desistiram de uma compra ao encontrar atendentes despreparados. Outro dado relevante é que 69% esperam interações personalizadas, baseadas em seu histórico e preferências, mas apenas 13% acreditam que as empresas conseguem entregar esse nível de personalização.

Esses números reforçam que, em mercados com produtos e preços semelhantes, a experiência no atendimento é o que diferencia uma marca das demais. A forma como as empresas tratam seus clientes tem se mostrado determinante para manter a fidelidade e fortalecer as marcas.

Um levantamento recente, intitulado “Dados sobre Consumo e Fidelização no Brasil”, aponta que 76% dos entrevistados veem o atendimento como peça fundamental para garantir a permanência do consumidor, enquanto 80% já deixaram de comprar de uma marca após uma experiência negativa nesse aspecto.

A pesquisa, conduzida pela Neogrid, em parceria com a Opinion Box, revela ainda que o peso do atendimento é quase unânime entre os brasileiros: apenas 6% demonstram indiferença, e uma parcela mínima o considera de pouca ou nenhuma importância – 1,7% e 0,3%, respectivamente.

Outro ponto de destaque é a personalização. De acordo com o estudo, 84% dos participantes valorizam quando marcas e varejistas oferecem ofertas personalizadas a partir do histórico de compras, enxergando nisso um diferencial positivo. Por outro lado, 9% não percebem vantagem nessas práticas e 7% permanecem indecisos quanto ao impacto real dessa estratégia.

Os dados corroboram a mensagem da especialista. A receita, segundo Flávia, está na combinação de processos bem definidos, preparo comercial e uma cultura de atendimento centrada no cliente. Em um cenário de altas expectativas e metas desafiadoras, fidelizar é tão estratégico quanto vender.

Como lembra Flavia: “o ponto central é oferecer um atendimento memorável e um pós-venda consistente” – premissas simples, mas capazes de fazer toda a diferença quando janeiro chegar e o fluxo de clientes for naturalmente menor. E tudo isso começa agora – no trimestre mais competitivo e simbólico do varejo moveleiro.

Fidelizar não é bônus, é estratégia

Ações simples e eficazes para maximizar o relacionamento e obter resultados sustentáveis

  • Prepare a equipe para encantar, não só vender: treinamento é essencial para que o atendimento vá além da ficha técnica do produto. O cliente precisa se sentir acolhido e compreendido.
  • Organize o pós-venda como etapa estratégica: mapeie os contatos após a entrega, crie um roteiro de acompanhamento e aproveite cada interação para construir vínculos e gerar indicações.
  • Aproveite o movimento para captar novos públicos: use o aumento no fluxo da loja para iniciar parcerias com designers, arquitetos e influenciadores locais. Relacionamento gera recorrência.
  • Crie experiências personalizadas: registre preferências, histórico de compras e necessidades específicas de cada cliente. Use essas informações para oferecer soluções sob medida.

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